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"Deveríamos ter prendido o presidente Yeltsin". A "revolução" que não aconteceu.



General Lev Rokhlin


Em 20 de julho de 1998 o presidente Boris Yeltsin deveria ter sido preso – o governo da Rússia passaria para as mãos dos militares. Duas semanas antes disso, o organizador da operação, o general Lev Rokhlin foi encontrado assassinado na própria datcha.

Sputnik Commercial & Consulting traz com exclusividade ao público brasileiro detalhes de um dos casos mais misteriosos da história recente russa. Uma "Revolução" que não aconteceu. Se vitoriosa poderíamos hoje nunca ter ouvido falar de Vladimir Putin e a Rússia teria sido governada no final dos anos 90 por uma junta militar nacionalista.

Lev Rokhlin de fato preparou um golpe militar. Esse foi provavelmente o único precedente em toda a história pós-soviética do que se pode chamar de um verdadeiro acordo militar para tomada do poder. Ou ainda, mais amplamente, o único em toda a história da Rússia depois do movimento decabrista.

O General-tenente e deputado Lev Rokhlin, homem que recusou a condecoração de Herói da Rússia pela “guerra civil na Chechênia”, desenvolvia em 1997-1998 uma forte oposição que assustava tanto o Kremlin quanto outros oposicionistas. Mais tarde, os deputados do Partido Comunista da Federação Russa viabilizaram a saida de RoKhlin, o general que comandou a operação militar em Grozni, capital da Chechênia nos anos 1990, do posto de chefe da comissão parlamentar sobre defesa na Duma (parlamento russo).


Lev Rohklin de fato preparou um golpe militar...

​Rokhlin então fazia parte do movimento “Nossa casa é a Rússia" mas, rapidamente saiu deste inexpressivo grupo político e criou o “Movimento em Apoio ao Exército, Indústria de Defesa e Ciência Militar”. No comitê organizador entrou o ex ministro da Defesa, Igor Rodinov, o antigo comandante dos paraquedistas, Vladslav Aknalov, o ex chefe do KGB, Vladmir Krutshkov e ainda uma série de outros então ainda influentes ex integrantes do aparelho de Estado.

Isso tudo naquele momento assustou não só o Kremlin, mas inclusive, o Partido Comunista da Federação Russa e o Partido Liberal.

Havia momentos em que os integrantes desse grupo se reuniam na datcha de Rohklin, inicialmente não havia um plano de tomada armada do poder. Porém, a situação econômica e social no país começou a se deteriorar muito rapidamente. Em agosto de 1998 ocorreu a crise da dívida soberana russa. Imagine caro leitor, o que teria acontecido se Rokhlin não tivesse sido assassinado. O general contava com o apoio do 8º. Corpo de Exército de Volgogrado, o qual havia comandado a partir de 1993 na primeira guerra da Chechênia, e mesmo quando se tornou deputado ainda gozava de forte influência sobre seus antigos comandados, regularmente se encontrava com oficiais, pessoalmente tratava de questões sobre o rearmamento do batalhão tendo o transformado em uma das unidades militares mais preparadas do país.


O plano de tomada do poder

O 8º. Corpo de exército de Volgogrado estava pronto para entrar em formação nas principais praças da cidade. Em Volgogrado Boris Yeltsin não dispunha de grande apoio como em São Petersburgo, além do 8º. Corpo de Exército a única força armada considerável na região era a Brigada de tropas do Interior que não podia fazer frente ao 8º. Corpo de Exército. Depois da entrada em ação do 8º. Corpo de Exército outras regiões adeririam, até mesmo o batalhão do Kremlin, a guarda presidencial estava dividido 50% contra e 50% a favor de Yeltsin. Este batalhão não poderia atrapalhar o levante.

Os postos principais das Forças Armadas eram ocupados por marionetes. Fosse dado dinheiro para alguns deles e eles diriam “ok, a guarda será retirada, eu vou embora, eis os contatos dos líderes mundiais”.

Foi analisado o fluxo de mercadorias que chegava Moscou e foi organizado comitês de greve nas cidades ao longo das rotas os quais bloqueariam a passagem de mercadorias nas vésperas da ação militar. A falta de mercadorias geraria uma energia social ainda mais negativa em relação ao governo. Ainda para esta parte do plano o grupo que pretendia prender Boris Yeltsin e tomar o poder contava com o apoio logístico do então prefeito de Moscou Lujkov, parte atuante da conspiração.

A propósito, no dia do assassinato do general Rokhlin, para as 11 horas da manhã estava marcado um encontro de Lujkov com ele para a definição de alguns detalhes.

Paralelamente a criação de um déficit de mantimentos em Moscou, planejou-se protestos em massa. Tudo estava coordenado, quem em qual região pelo que responderia depois da chegada em Moscou.

Os conspiradores ainda contavam com aviões de transporte da frota do oceano Atlântico, fuzileiros navais de dois ou três batalhões ficaram estacionados em uma base aérea esperando a ordem para voar para Moscou.

Ao mesmo tempo, no mar negro, em Sevastopol, estava de prontidão a brigada de fuzileiros navais. Mais próximo a Moscou, na cidade de Ryzani, cerca de 200km capital federal a Brigada Paraquedista estava 100% a favor da derrubada de Yeltsin.


A participação civil

Este era um plano complexo, atendia a todos os requisitos do que em ciência se chama de “sistema de engenharia de projetos”.

Ação de força do exército

Ações informativas

Apoio político nas regiões

Apoio econômico e até apoio externo

Pontes, estações de trem, correios, paralisar os trabalhos do aparelho de Estado não é difícil. Grupos armados cortariam as comunicações, entrariam em estações de TV e rádio e anunciariam o afastamento do presidente apresentando sua renuncia por escrito.

De 15 a 20 mil homens chegariam em Moscou vindos de Volgogrado num só dia. Isso seria o suficiente para paralisar as atividades de todas as instituições de poder. Já haviam grupos formados e listas de quem ia de ônibus e quem ia de trem.

De onde vinha o dinheiro para a operação? Contribuições de pessoas físicas e entidades da sociedade civil. O chefe do Departamento de Estradas de Ferro ofereceu acoplar a vagões de passageiros outros vagões que levariam soldados de Volgogrado a Moscou incógnitos. Outro, um diretor de uma fábrica, ofereceu suprir de mantimentos parte das tropas. O prefeito de Voljski, cidade próxima a Volgogrado conseguiu 15 ônibus. Outro colaborador, do próprio bolso, comprou 5 mil uniformes e botas militares. Nos postos de gasolina de Volgogrado carros eram abastecidos sem dinheiro através de uma senha especial e um recibo: “Quando tomarmos o poder reembolsaremos”. Assim houve apoio de amplos setores da sociedade civil e sobretudo, de contatos próximos a Rohklin no complexo industrial militar que sofria cortes de encomendas estatais na área de defesa.

Nos feriados de maio (dia do trabalho e dia da Vitória na II Guerra) aconteceram uma série de manifestações que levantavam bandeiras em apoio ao exército. Tratava-se de uma sondagem dos meios militares para testar o apoio da população e dos demais oficiais. Verificou-se um apoio massivo aos movimentos contestatórios ao governo e de apoio aos militares de maneira que uma marcha dessas unidades em direção a Moscou teria sido um sucesso.

O apoio político deveria vir do Ocidente. Claro que não estamos falando da OTAN, e sim de Aleksander Lukashenko. Houve um encontro secreto do general Rokhlin com o presidente da Bielorrússia Aleksander Lukashenko na floresta na fronteira com a Bielorrússia.


O ensaio falhou

Estava tudo marcado para o dia 20 de junho de 1998. Lev Rokhin chegou a Volgogrado. Alguns dos principais líderes se reuniram em uma sauna, depois da qual discutiram toda a operação pela última vez. Pela manhã os comandantes voltaram a seus postos. As 4 da manhã do dia seguinte o veículo onde estava o general Rokhlin e Nikolay Batalov, outro alto comandante da operação foi seguido por uma viatura das tropas do interior leais a Yeltsin. Haviam sido descobertos. Porém, o governo ainda não sabia onde era o centro de comando, as ligações e as reais dimensões do plano de tomada de poder, imaginava o general. Depois desse episódio, o general Rokhlin decidiu adiar a marcha de suas tropas até moscou. Ele não viveria nem mais duas semanas depois disso. Em Moscou, na Duma, ele alegou não saber de plano algum. Nunca entregou nenhum de seus camaradas. Batalov que ocupava um posto de alto comando em um batalhão foi exonerado, chamado para depor no FSB (Serviço Federal de Segurança – serviço secreto russo), onde o fizeram ouvir um áudio onde estavam gravadas as conversas na sauna em Volgogrado. Todos estavam grampeados.

Depois do ocorrido o 8º. Corpo de Exército sofreu reformulações e seus oficiais caíram em desgraça.

No Museu da Batalha de Stalingrado na cidade de Volgogrado já não se pode ver a bandeira do histórico 8º. Corpo de Exército que na Segunda Guerra defendeu Stalingrado. Ela havia sido requisitada pelo arquivo do Museu das Forças Armadas e Moscou para que nada na cidade lembrasse o batalhão que conspirou contra Boris Yelstin.

Mesmo hoje, tendo se passado 18 anos, essa parte da história russa não é bem conhecida. É possível que o general Rokhlin não tivesse a real compreensão de quem o apoiava e de quem não o apoiava na realidade, e tornou-se refém de seu próprio círculo de pessoas influentes que garantiam a ele o apoio do exército. Possivelmente Rokhlin foi vítima de sua própria inexperiência política. Ao seu redor haviam pessoa que lhe eram pouco conhecidas.

Depois da primeira tentativa de tomada de poder a qual foi descoberta pelas forças leias ao presidente, uma segunda foi planejada para 20 de julho, um mês depois, porém, em 3 de julho Rokhlin foi assassinado.


Comitê de Salvação da Rússia

Havia um plano de ação entre os conspiradores em caso de vitória. Do ponto de vista da realidade política imaginava-se que após a tomada do poder seguir-se-ia um período de transição. Uma ditadura militar revolucionária, período o qual deveria terminar após eleições gerais onde provavelmente o mesmo grupo que tomou o poder ganharia.

O governo provisório teria como líderes 5 pessoas cujas identidades não são conhecidas até hoje. O que se sabe é que Rohklin não faria parte deste grupo pois ele mesmo não queria. Não queria nem ser ditador nem governante eleito. Ele via a si mesmo como um instrumento para cumprir uma função: retirar Yeltsin e sua gangue do poder.

Os cinco comporiam o que foi chamado de “Comitê de Salvação da Rússia”, todos os cinco com iguais poderes. Em todas as regiões do país surgiriam os “observadores”, funcionários do novo governo que coordenariam as estruturas de Estado, justiça, milícia, exército e etc. Baklanov teria sido um desses observadores em Volgogrado.

Um tiro na conspiração

Em 3 de julho de 1998 Rokhlin foi morto na sua própria datcha na aldeia Klokovo na região de Moscou. A procuradoria afirmou que o general foi morto com sua própria pistola pela esposa Tamara. O motivo teria sido uma briga de casal.

Pessoas próximas ao general não têm dúvidas de se tratou na realidade de uma vingança do Kremlin e tentativa de prevenir uma insurreição das Forças Armadas.

Depois do assassinato de Rokhlin foram encontrados assassinados os assassinos e ao mesmo tempo únicas testemunhas do que havia ocorrido na datcha do general. A segurança do general foi comprada. No sótão da datcha se esconderam três assassinos. Eles mataram o general e abandonaram a datcha e cerca de 800 metros dali eles próprios foram assassinados. Os corpos foram encharcados com gasolina e queimados.

Tamara Pavlovna, esposa do general ficou 3 meses em estado catatônico no hospital. Passaram-se seis anos e apenas depois de queixas do Tribunal Europeu de Direitos Humanos sobre a demora do processo, Tamara Pavlovna foi condenada a 4 anos de prisão em regime de isolamento, sentença que sua defesa não contestou. Assim, foi mantido o status quo. A segurança do general não foi investigada e os outros assassinos não foram procurados. As investigações oficiais sobre a revolução falhada acabaram em nada. Ninguém sofreu acusação alguma. Tudo se limitou a limpeza dos postos de oficiais e dissolução do 8º. Corpo de Exército.


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